Em Cristo a misericórdia supera a justiça Palestrantes: Celso e Mírian Berardo – Diocese de Franca




O Encontro de Casais com Cristo completa-se com a 3ª etapa, que tem como temática a Justiça Social, tratada de maneira profunda na Doutrina Social da Igreja. A 3ª etapa não se limita aos três dias do encontro, pelo contrário, deve ser vivida, concretizando-se no estudo, na formação e, conseqüentemente, na conversão à Doutrina Social. Deve ser a etapa de intensa formação e profunda conversão à Doutrina Social da Igreja, com vistas a um agir consciente, orientado, embasado, planejado de acordo com princípios de reflexão (ver), critérios de julgamento (julgar), diretrizes de ação (agir). A doutrina social cristã reivindica e ressalta “o seu caráter de aplicação da Palavra de Deus à vida dos homens e da sociedade, assim como às realidades terrenas que com elas se relacionam” . Ela deve ser “um forte momento de reflexão e aprofundamento sobre a dignidade da pessoa humana, criada á imagem e semelhança de Deus”, propiciando uma profunda reflexão “sobre as injustiças a que o mundo atual submete essa criatura que, marginalizada (exclusão), é impedida de se realizar como ser humano como filho de Deus e como cristão, vivendo um clima de injustiça, de opressão e de dependência” .

Dentre os grandes desafios de nossa realidade podemos destacar:
- A pobreza crescente e os grandes contrastes.
- A violação dos direitos humanos.
- A ameaça de um desastre ecológico.
- O pluralismo religioso.
-A massificação e o anonimato no mundo urbano.
- A desagregação da família, célula da comunidade e da sociedade.

Diante disso é de se indagar quais os fatores responsáveis por essa situação e como enfrentar e como superar esses desafios?

Capitalismo ou comunismo, Governos democráticos ou autoritários, monarquia ou república, parlamentarismo ou presidencialismo, regimes de esquerda ou de direita; Constituições, leis... nada tem sido capaz de enfrentar e superar esses desafios.

A Justiça legal em qualquer regime político ou sistema de governo, qualquer que seja a ideologia, não tem conseguido amainar o crescente processo de desumanização trilhado pela sociedade.

Apenas a Justiça Social será capaz de restabelecer a dignidade da pessoa humana em sua plenitude.

Ao propor uma distinção entre as virtudes cardeais, diz o Catecismo da Igreja Católica que "a justiça é a virtude moral que consiste na vontade constante e firme de dar a Deus e ao próximo o que lhes é devido”. Em relação aos homens essa justiça se “dispõe a respeitar os direitos de cada um e a estabelecer, nas relações humanas, a harmonia que promove a eqüidade em prol das pessoas e do bem comum. O homem justo, muitas vezes mencionado nas Escrituras, distingue-se pela correção habitual de seus pensamentos e pela retidão de sua conduta para com o próximo" ("Não favoreças o pobre, nem prestigies o poderoso. Julga o próximo conforme a Justiça" - Lv. 19,15) ("Senhores, dai aos vossos servos o justo e eqüitável, sabendo que vós tendes um Senhor no Céu" - Cl. 4,1) .

Na trilha do ensinamento de João XXIII, na “Mater et Magistra”, “a sociedade garante a Justiça Social quando realiza as condições que permitem às associações e a cada membro seu, obter o que lhe é devido, conforme sua natureza e sua vocação”, ressaltando que “a Justiça Social está ligada ao bem comum e ao exercício da autoridade. Só se pode conseguir a Justiça Social no respeito à dignidade transcendente do homem. A pessoa representa o fim último da sociedade, que por sua vez lhe está ordenada."

Mas para que se consiga atingir a Justiça Social, não basta a mera partilha dos bens materiais, é preciso, sobretudo, amor, um amor-misericórdia.

Buscando reduzir o Antigo e o Novo Testamento, cada qual a uma palavra, poderemos encontrar a síntese desta palestra.

A Justiça resume o Antigo Testamento e Amor traduz o Novo.

Em hebraico existem duas palavras que significam Justiça, porém com acepções diversas: Tsedakah e Tsedek. Na Bíblia hebraica a primeira aparece 157 vezes e a segunda 119. Embora a distinção entre uma e outra nem sempre seja observada, “percebe-se que a justiça é um valor fundamental. Ela está ligada diretamente à fé em Javé e à organização da sociedade. Ter fé, crer significa comprometer-se com a justiça, estruturar a sociedade com leis que garantam sua implantação, envolvendo os setores: político, jurídico, religioso e educacional” .

A salvação é ato da justiça misericordiosa de Deus; mas está também vinculada à nossa resposta. O Juízo Final significa em verdade o ato final de justiça de Deus, quando irá tornar correto tudo que é incorreto ou injusto. No Antigo Testamento a Justiça inclui a Justiça econômica; as obras de misericórdia que hoje praticamos, no Antigo Testamento são denominadas obras de Justiça.

O Novo Testamento, por sua vez, nos mostra Jesus falando de compaixão e amor. Jesus é movido pela compaixão. A compaixão é a interiorização da Justiça, ela nos impele a fazer Justiça espontaneamente e de boa vontade. Ela nos leva à ação, à prática da justiça, a endireitar aquilo que está errado em nosso mundo.

Assim amor e justiça não podem ser separados e opostos um a outro. A justiça é a pratica do amor em um mundo onde milhões sofrem por causa da injustiça.

A Igreja, embora se alegre com as iniciativas dos outros, reivindica as obras caridade como dever seu e direito inalienável. “Por isso a misericórdia para com os pobres e enfermos e as assim chamadas obras de caridade e de auxílio mútuo, para socorrer as múltiplas necessidades humanas, são pela Igreja, honradas de modo especial” .

“Onde quer que haja alguém” carente em todos os sentidos, “aí a caridade cristã deve procurá-lo e descobri-lo, aliviá-lo com carinhosa assistência e ajudá-lo com auxílios oportunos. Esta obrigação impõe-se, em primeiro lugar, aos homens e aos povos cercados de prosperidade” , competindo sobretudo aos leigos, prestigiar e ajudar as obras de caridade e as iniciativas de assistência social, sejam particulares ou públicas, e mesmo internacionais, por meio das quais se leva auxílio eficiente aos indivíduos e povos em necessidade. Neste campo cooperem com todos os homens de boa vontade”.

São as obras de misericórdia que nos introduzirão “no reino das bem aventuranças eternas” e a misericórdia que nos impõe pressionar a opinião pública e os governantes das nações para que auxiliem mais generosamente as nações, povos e, em particular, todas as pessoas que necessitam ajuda.